O título desta reflexão parece
redundante. Por que falar de valores humanos? Oxente! Todo valor não é humano?!
Como quem está lendo estas linhas, que é pelo menos a maioria dos que têm
clareza do que é a condição humana, eu também penso assim; contudo,
questionamentos e interrogações, fruto de observações e associações históricas,
nos colocam diante de perplexidades e espantos realistas do que atualmente acontece no carnaval e como este evento de tanta
relevância para a cultura brasileira tomou formas e estilos que nos faz pensá-lo
não mais como um acontecimento cultural, mas, como meio “abrasileiralizado” de
fazer festas.
Precisamos pensar a cultura como
forma objetiva de manifestação da subjetividade humana. Esta é o que possibilita
falarmos do espírito da história, que não é amorfa, desconexa, irracional, já
que existe e é conhecida por causa do ser humano. Nada do que é tido por cultural pode trair a história. A traição desta
é uma violência à própria humanidade, que precisa ser considerada sempre de
modo circunstanciado e temporal. O que é dito sobre o carnaval de hoje não pode
negar o que era, o que é e o que será o carnaval de amanhã. A evolução da
cultura não dispensa o que a gerou e porque ela pode continuar existindo. Deve
nos inquietar, na modernidade ou pós-modernidade, a falta de sentido para o que
é simbólico e que foi fruto das construções daqueles que nos precederam. Quem
deseja construir “novas culturas”, o faz com o intuito de reconstruir novas
ordens sistêmicas e de poder. Só que agora através das atuais constituições,
sejam elas ideológicas e/ou estruturais. Nesse sentido, os “grandes meios de
comunicação” têm dado as cartas e ditado as orientações que a “massa” vai
acolhendo sem ser violentada fisicamente, embora que, mentalmente. Novos
valores são injetados, não pelo que é naturalmente humano; mas, e acima de
tudo, pelo poder econômico que gera poder e por este é gerado. Nesse sentido, respondo
à provocação propedêutica: o que é “valor humano” não pode desconstruir as
formas universais da pessoa humana.
O carnaval, para continuar a ser
expressão cultural e constitutiva da nossa história e dos nossos costumes, tem
que resgatar nossas manifestações folclóricas, artísticas, lúdicas, religiosas
e estéticas. O que vemos hoje é o patrocínio público e privado de criações
imediatas e vazias que não promovem valores humanos e culturais. Bandas e
grupos musicais que não dizem nada com nada em suas letras musicais, o alto
consumo de bebidas alcoólicas e outras drogas pesadas nas grandes
concentrações, distribuição de preservativos para muitos jovens, que deveras
não têm unicamente a finalidade de prevenir doenças; mas, mais um meio
utilizado para obtenção do dinheiro público; o que não é dito à população. Que
mensagem é transmitida aos participantes de festividades carnavalescas por quem
está ali para entregar preservativos? Qual a intenção da classe política que
faz questão de afirmar que as pessoas só gostam de festa? Os imperadores
romanos ofereciam pão e circo para “alienar o povo” das suas reais
necessidades. Será que o carnaval, como fenômeno histórico e cultural, serve
para isto? Em si, o carnaval não é bom nem mal. Ele é o que as pessoas fazem
dele para construção de valores que as leve a viver dignamente, sem violentar e
trair a sua humanidade. Por fim, que todos nós possamos viver bem e
conscientemente mais um período carnavalesco, no qual nossas raízes e nossa
cultura sejam realmente elevadas e enfatizadas! Assim o seja!
Pe. Matias Soares
Pároco de São José de Mipibu-RN e
Vig. Episcopal Sul